Antes de Maquiavel, o governante de um país era
comparado ao piloto de um navio. São Tomás de Aquino (1227-1274), por exemplo,
no seu tratado De Regno (Do Reino), dizia que ao piloto de um
navio cabem duas funções: a) preservar o navio para que não se afunde e sofra
avarias; b) conduzir o navio ao porto. Do mesmo modo é o governante de uma
República, ou seja, deve conduzir o povo, no sentido de não haver dispersão e, ao
mesmo tempo, encaminhá-lo para a prática da virtude.
Maquiavel (Nicolò machiavelli, 1469-1527), em O
Príncipe, pensa o governo de forma inédita: aceita a primeira função, que é
a de preservar o governo das avarias, porém faz silêncio sobre a condução do
povo à virtude. Cabe ao governante deixar a República intacta, não resta
dúvida; quanto ao realizar a justiça, tem suas dúvidas. O Príncipe retrata
o descontentamento do seu autor por ter sido banido da vida pública. O que está
por detrás do livro é a aparência do bom e do virtuoso que o condutor do povo
deve ter. Não importa se o ser humano é virtuoso, mais vale parecer virtuoso.
Até a vinda de Maquiavel, os manuais de política
procuravam dizer ao príncipe o que ele deveria fazer para bem conduzir o seu
povo. Para Maquiavel, o governante tem que saber resolver conflitos. A
experiência mostra, segundo ele, que a vida social é constituída por um
conflito fundamental entre dois grupos sociais – os grandes e o povo. O desejo
dos grandes é governar e oprimir o povo; o desejo do povo é não ser oprimido
pelos grandes. No capítulo IX de O Príncipe, escreve: "Em
todas as cidades se encontram estas duas tendências diversas".
O livro de Maquiavel pode ser dividido em duas
grandes partes: do capítulo 1.º ao 15.º, trata dos diversos tipos de
principados e de como administrá-los. Nesses capítulos exalta-se que a força é
um elemento constitutivo de poder político. Além disso, essa força deve ser uma
mediadora de conflitos, porque não se pode agradar a todos em todos os momentos.
Na segunda parte, trata de como o príncipe pode parecer bom aos outros. Hoje,
esse trabalho é feito pelos marqueteiros.
De um lado, diz que o príncipe deve cuidar para
ser bem visto para poder governar. Do outro lado, diz que o
príncipe deve aprender a não ser bom. Como conciliar essa duas afirmações? Eis
a questão proposta por Maquiavel. O príncipe precisa às vezes frustrar as
expectativas que se depositam sobre ele. O que está em jogo é que a melhor ação
nem sempre é aquela que é vista e avaliada como
boa, nem a pior ação é aquela que é vista e avaliada como má. O cenário
político é um jogo em que os mais argutos (chamados sofistas na Antiguidade) acabam
vencendo os mais justos.
Embora tenha escrito este livro como uma resposta
ao seu banimento da vida pública, O Príncipe de Maquiavel é um
clássico e, muitas das suas ideias, estão presentes em nossa vida política
atual.
Fonte de Consulta
LIMONGI, Maria Isabel. Ética e Política n’O
Príncipe de Maquiavel. In FIGUEIREDO, Vinicius de (Org.). Seis
Filósofos em Sala de Aula. São Paulo: Berlendis & Vertechia, 2006.
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