02 julho 2008

O Segredo

O Segredo é o título da teoria e prática desenvolvida pela australiana Rhonda Byrne, de 55 anos. Com 50 anos, sem marido, as filhas crescidas e seu negócio (produzir séries para a TV australiana) afundado em dívidas, teve um insight ao ler, por acaso, o livro A Ciência de Enriquecer, publicado em 1910. Disse: "Incrédula, me perguntei: como é possível que isso não esteja ao alcance de todas as pessoas? Fui consumida por um premente desejo de dividir O Segredo com o mundo".

Para fundamentar o seu desejo, buscou na história da religião e da filosofia respaldo para as suas ideias. Há citações de Buda, Jesus, Emerson e tantos outros. Em termos operacionais, leu "centenas" de livros e artigos que tratam do pensamento positivo. Depois, foi ao encontro dos luminares da área "melhore já a sua vida", nos Estados Unidos. Cada um deles deu o seu depoimento num vídeo sobre a lei da atração, lei esta com tinturas de "ciência quântica". Se Heisenberg fala da incerteza, nós falamos da certeza.

O livro, o DVD e o filme tratam de um único tema, ou seja, a lei de atração. É uma espécie de lavagem cerebral, em que verdades são misturadas com meias verdades, no sentido de enganar a mente menos avisada. O Segredo ensina a barganhar com o universo. Para tanto, busca respaldo na sabedoria religiosa. Cita, por exemplo, um aforismo de Buda: "Tudo o que somos é resultado do que pensamos", mas nada fala do desapego às coisas materiais explicitadas pelo budismo. Com relação a Jesus, lembra a frase: "Tudo quanto pedirdes em oração, crendo, recebereis". Transforma Buda e Jesus em gurus do pensamento positivo.

Do começo ao fim do filme, há uma tese central, a lei de atração, vista sob diversos ângulos: há apelo ao ganho monetário, ao êxito, à cura de uma doença, ao perfeito relacionamento entre os seres humanos. Basta que você pense em algo que aquilo se expande. Por isso, é proibido pensar negativamente, tem que pensar sempre positivamente. Há o caso da mulher que tinha detectado um câncer no seio. Não lhe deu atenção, reagiu como se não tivesse o câncer. Resultado: o câncer foi curado.

Como interpretar a lei da atração, evocada constantemente no filme, com a lei de ação e reação, veiculada pela Doutrina Espírita? De acordo com o Espiritismo, as causas do sofrimento na vida presente podem estar tanto no passado recente como num passado longínquo (encarnações passadas). Se, para o ressarcimento da dívida, o ser humano tem que viver na pobreza, por mais que ele tente ser rico não o conseguirá tão facilmente, dada a sua necessidade de progresso espiritual. O pensamento mágico cai por terra.

Façamos uma comparação entre o "cientificismo" individualista do pensamento mágico — se eu enriqueci, você também pode — e a filosofia dos antigos. A moral primitiva implicava a regulamentação do comportamento de cada um de acordo com os interesses da coletividade. O indivíduo era mero suporte, auxiliar na concretização dos objetivos do grupo. Além disso, como se explica o voto de pobreza de um Francisco de Assis? De uma Tereza de Calcutá?

Saibamos separar o joio do trigo. Não nos deixemos guiar pela palavra fácil, pelo discurso cômodo, pelos efeitos especiais da imagem cinematográfica. A verdade está no fundo e poucos estão interessados em descobri-la.

 

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