01 julho 2008

Mário Ferreira dos Santos

"O homem é um fim e não um meio. Utilizá-lo, transformá-lo em peça de um mecanismo, é ofender a sua dignidade." (Mário Ferreira dos Santos)

Mário Ferreira dos Santos (1907-1968) nasceu em Tietê, São Paulo, mas foi educado em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Formou-se em Direito e Ciências Sociais pela Faculdade de Direito de Porto Alegre. Foi advogado, diretor de jornal, tradutor, professor e escritor multiprismático. Dentre as várias traduções, citam-se "Assim Falava Zaratrusta" e "Vontade de Potência", de Friedrich Nietzsche. Uma das críticas que mais recebeu foi a da extrema produtividade intelectual que causou, e ainda causa, estranheza. Dizia ser filósofo e não professor de filosofia. Em 1930, quando tinha 23 anos, foi preso em virtude de seus ideais libertários.

O pensamento de Mário Ferreira dos Santos era robusto, pois procurava abarcar tudo o que de bom existia nas diversas escolas filosóficas. Era, por essa razão, chamado de ecumênico. Na sua busca procurava reter o que era positivo, ou seja, aquilo que servia para construir o homem. Nesse sentido, dizia que "O homem é um fim e não um meio. Utilizá-lo, transformá-lo em peça de um mecanismo, é ofender a sua dignidade". Falava também que "todo homem deve viver e morrer como um guerreiro". Por defender convictamente as suas ideias, era tachado de persona non grata em alguns círculos de ação.

Combatia exaustivamente a atitude brasileira de dar valor ao importado. Acreditava na possibilidade do povo brasileiro... "Todos aqueles que no Brasil revelaram possuir mente filosófica, e não foram muito numerosos, mas, contudo, foram brilhantes, tenderam sempre a um pensamento sintético; isto é, não ficaram totalmente dependentes às correntes filosóficas europeias". O que na realidade tinha em mente era defender a sua pátria, dando, ao mesmo tempo, apoio e coragem para que o brasileiro – jovem ou adulto – fosse o construtor do seu próprio destino, e também de seu país.

"Nunca ocupei", escreveu ele, "nenhum cargo em nenhuma escola, por princípio. Deliberei, desde os primeiros anos, tomar uma atitude que consiste em nunca disputar cargos que podem ser ocupados por outros. Sempre decidi criar o meu próprio cargo, a minha própria posição e situação, sem ter de ocupar o lugar que possa caber a outro... Eis porque não disputo, nunca disputei nem disputarei qualquer posição que possa ser ocupada por quem quer que seja".

A obra de Mário não tem similar, nem por sua extensão oceânica, mais de cem volumes publicados e trinta inéditos, nem pela orientação muito peculiar de seu pensamento, onde as influências mais díspares, de Sto. Tomás a Nietzsche, e Pitágoras a Leibniz, de Platão a Proudhon, se harmonizam numa síntese radicalmente original. Escreveu artigos políticos e de cultura para os jornais Opinião Pública, de Pelotas, e Diário de Notícias e Correio do Povo, de Porto Alegre. Foram quase duas centenas de artigos versando, principalmente, sobre aspectos da II Guerra Mundial.

Dizia que a filosofia só é válida quando concreta, ou seja, quando o filósofo, mesmo fazendo uso da abstração não se separa da realidade. Para ele, a filosofia deve ser "dialeticamente construída, sem esquecer o que une, o que está incluso, o que exige para ser, o que implica, o que, enfim, se correlaciona, se entrosa e se analoga". Acrescenta que o pensamento concreto é aquele que esclarece, aquele que não esquece de meditar com as representações e os conteúdos fáticos, que são dados pela intuição sensível.

Na sua crise religiosa, converte-se ao cristianismo, demonstrando que "esta é a única religião que não depende de raça nem de ciclo cultural, pois surge de uma revelação através do próprio homem, pedindo a ele que seja perfeito naquilo que lhe é próprio, quer dizer, na superação humana, que se realiza pela purificação da vontade, pela clareza e pela acuidade do pensamento, e pelo acrisolamento do seu amor". Com relação ao ateísmo, dizia que a maioria das contradições se dava em virtude das perguntas mal formuladas. As pessoas divergem com relação ao dogma da Santíssima Trindade, não com relação à existência de Deus.

Eis uma biografia para ser ponderada e refletida. Lutador, guerreiro, libertário de ideais e homem de bem que deu a vida para que a verdade resplandecesse no seio da sociedade.

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A Revista Conhecimento Prático Filosofia, número 18, publicou um artigo de Carlos Aurélio Mota de Souza, "Por que Reler Mário Ferreira dos Santos Hoje?" e uma entrevista, organizada pelo Padre e Professor Stanislavs Ladusãns, que foi publicada no ano de 1976, em "Rumos da Filosofia no Brasil". Nas suas 21 páginas, há muitas informações sobre a pessoa, a obra e o pensamento de Mário, o grande (desconhecido) filósofo brasileiro.

 

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