A filosofia é definida, desde a
sua origem, como a capacidade de o ser humano espantar-se com
as coisas ao seu redor. Para Platão e Aristóteles, a metafísica se originava na
admiração (mirandum). Eis porque os primeiros filósofos, contemplando o
espetáculo familiar da abóbada celeste, e sentindo-se colhidos de admiração
perante o movimento das estrelas e dos planetas, a si próprios formularam
questões a propósito de um espetáculo até então passivamente aceito por todo o
mundo.
O que significa a palavra mirandum? É o maravilhoso, o sobrenatural, aquilo que transcende a
percepção do concreto. É como se o ser humano procurasse algo além do objeto,
algo além desta própria vida, o incomensurável. Esse esforço tem por objetivo
captar a totalidade da vida, não a fornecida pela tradição teológica, mas
aquela construída "de baixo" para cima, como sói ser a função
precípua da Filosofia. É preciso, pois, refletir sobre o maravilhoso, porém sem
precipitação e sem preconceito.
Sócrates, depois que deixou o
jovem matemático Teeteto tonto de admiração, diz: "É precisamente essa
atitude que caracteriza o filósofo; este, e não outro, é o começo da
Filosofia". Aristóteles e S. Tomás diziam que o ato de filosofar se
assemelha à poesia: "Tanto o poeta quanto o filósofo se ocupam do
maravilhoso, daquilo que suscita e alimenta a admiração". Goethe, já em
idade avançada diz: "Eis que existo para admirar"; "O grau
supremo a que o homem pode chegar é a admiração".
A filosofia moderna – revestida
da pretensa racionalidade –, deixa de lado o espanto para se chafurdar nos
caminhos da dúvida. Descartes, por exemplo, começava por duvidar de tudo,
passando uma borracha sobre tudo o que tinha aprendido até o momento para, depois,
através da razão, ir construindo paulatinamente os conceitos. Chega, inclusive,
à noção de Deus: como um ser finito pode captar o infinito? Somente com o auxílio
de algo infinito, que é o próprio Deus. Esqueceu-se de dizer que Deus é
encontrado pelo sentimento e não pela razão.
A reflexão sobre o mirandum leva-nos necessariamente à noção de Deus, da
esperança e da caridade. Para o funcionamento do Universo, há necessidade de um
Criador, de um Organizador, o qual denominamos Deus. Para as incertezas da vida,
necessitamos da esperança, uma espécie de crença nas impossibilidades, mas com
a certeza de que tudo vai dar certo. E por último, a caridade, que é a
disposição de fazer o bem ao próximo sem nenhuma expectativa de recompensa.
Como vemos, a capacidade de ver
as mesmas coisas com outros olhos, não é tarefa fácil. Exige uma mente aberta
às inspirações do alto. Somente assim poderemos transcender o imanente do
dia-a-dia.
Fonte de Consulta
PIEPER, Josef. Que
é Filosofar; Que é Acadêmico? Tradução
de Helmuth Alfredo Simon. São Paulo: EPU, 1981.
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