As grandes ideias — que perfazem mais de 2500 anos — têm fracassado na penetração
do coração humano. Os ideais da tradição judaico-cristã e do cristianismo, rememorados por milhões de pessoas, não têm sido suficientes para impedir as atrocidades de
uma guerra global, holocaustos e assassinatos em massa. Cristo, Moisés e Platão
têm permanecido apenas como ideias. Mas as ideias não transformam o ser humano?
A filosofia do mundo ocidental nasceu da percepção de impotência da
mente. Para Sócrates, tanto a religião como a ciência de seu tempo não estavam
orientando o homem à virtude. É bom esclarecer o sentido específico da virtude:
Sócrates dizia que a virtude consistia no objetivo da vida humana. O termo “autodomínio”
não possui esta tonalidade precisa do significado, isto é, que o único objetivo
digno de um ser humano é a criação de um canal de responsabilidade e relacionamento
entre a verdade, ideias e mente, de um lado e as estruturas inconsistentes da natureza
humana, de outro.
Sócrates não focou especificamente na ciência, na religião, na arte, na
política. Ele apenas questionava e interrogava. Mas, em que consistia o
questionamento socrático? Consistia em rasgar continuamente o mundo das aparências.
Fica a seguinte dúvida: se a virtude era o objetivo de Sócrates, por que era
perseguida por intermédio de questionamentos ao invés da exposição de doutrinas,
de análises conceituais, sínteses de grandes ideias?
Penetrar além do mundo das aparências significa pôr em xeque nossas
crenças, opiniões e certezas, não apenas com respeito aos objetos, mas a nós
mesmos. Para Sócrates, o canal da virtude, o poder da verdadeira filosofia,
reside no poder de auto indagação. Podemos amar a grandeza da verdade; contudo
isso, por si, não nos modifica, não nos transforma.
Tudo o que sabemos de Sócrates veio por intermédio de Platão. Platão apresenta Sócrates como um homem que nada sabe, cuja “sabedoria” consiste no fato de que apenas ele, dentre todos os atenienses, se dá conta da própria ignorância. Aí está a raiz da “ironia” socrática.
Fonte de Consulta
NEEDLEMAN, Jacob. O Coração da Filosofia.
Tradução de Júlio Fischer. São Paulo: Palas Athena, 1991.