10 abril 2024

Exercícios Filosóficos do Estoicismo

Lembre-se da dicotomia do controle. Algumas coisas dependem de nós, outras não. Dedique sua atenção ao que você pode controlar, como o desenvolvimento do caráter bom, e não em elementos do acaso ou da Fortuna, que escapam ao seu controle.

Lembre-se do papel do juízo. As coisas em si não nos irritam. São o juízos ou opiniões sobre elas que causam sofrimento.

Contemplação do sábio. Imagine que uma pessoa sábia como Sócrates está observando suas ações. Ao enfrentar uma situação difícil, pergunte-se como essa pessoa sábia reagiria.

Diário filosófico. Crie seu próprio caderno de meditações e ensinamentos estoicos, como Marco Aurélio fez, com lembretes para si mesmo. Pegue as ideias filosóficas centrais e as reformule com suas próprias palavras, ou detalhe em seu diário como você pode fazer uso delas.

Reavaliação diária. Ao fim de cada dia, reflita sobre suas ações. Faça a si mesmo as seguintes perguntas: O que eu fiz bem? O que fiz mal? Como posso melhorar? O que deixei de fazer?

Transforme a adversidade em algo melhor. Quando você encontrar a adversidade, transforme-a em algo melhor. É possível criar o bem em qualquer situação, se reagirmos com virtude.

Premeditação da adversidade. Imagine brevemente quaisquer adversidades que você poderá enfrentar no futuro. Depois, deixe os pensamentos se dispersarem. Ao contemplar as adversidades antecipadamente, você tira o poder delas, caso venham mesmo a acontecer.

Cláusula de reserva estoica. Quando você iniciar um projeto, viajar, fizer um planejamento, diga a si mesmo: "Aceito o destino." Tenha em mente que, apesar de suas intenções serem as melhores, algo fora do seu controle pode interferir nos seus planos.

Contemplação do todo. Perceba que você é apenas uma parte minúscula de um universo inteiro, mas, ainda assim, parte do universo. Por um momento, abra sua mente para abarcar todo o cosmos e vivencie sua conexão com o todo.

Visão do alto. Imagine que você está muito acima da Terra, no espaço, olhando-a do alto. Então lembre-se de como seus problemas pessoais são pequenos no grande esquema das coisas.

Contemplação da mudança. Medite sobre como todas as coisas na natureza estão em constante mudança, e como tudo passa por uma transformação contínua por períodos curtos ou longos.

Contemplação da impermanência. Perceba que tudo que você possui lhe foi dado por empréstimo. Lembre-se de que é certo apreciar os dons da Fortuna enquanto eles estão conosco, emprestados, mas que um dia teremos de devolvê-los.

Memento mori. Reflita sobre sua própria condição mortal, a condição das pessoas que você ama como seres mortais, e sobre a morte como sendo apenas o estágio final e natural de estar vivo. Agradeça pelo tempo que você tem pela frente e se esforce para usá-lo com sabedoria.

Viva com gratidão. Perceba, a cada dia, que tudo que você tem é um presente do universo. No fim da vida, olhe para tudo que viveu como uma dádiva, com o sentimento de gratidão.

Viva no momento presente. Não permita que sua mente se antecipe ou se preocupe com o futuro, pois isso é fonte de ansiedade. Em vez disso, planeje o futuro de forma racional e lembre-se de que o momento presente é tudo que temos. Caso comece a sentir ansiedade, tenha consciência disso e volte sua atenção para o presente. Lembre-se de que, quando o futuro chegar, você enfrentará os acontecimentos com a mesma racionalidade que enfrenta hoje.

Aja pelo bem comum. Lembre-se de que você é parte da comunidade humana e de que nascemos para ajudar uns aos outros. Lembre-se de agir pelo bem das outras pessoas.

Analise suas impressões com cautela. Não aceite as coisas por seu valor aparente nem faça juízos precipitados. Recue um passo e tenha cautela ao analisar as evidências antes de formar uma opinião. Se as evidências não forem firmes o suficiente, interrompa totalmente qualquer juízo.

FIDELER, David. Um Café com Sêneca: Um Guia Estoico para a Arte de Viver. Tradução de Heci Regina Candiani. Rio de Janeiro: Sextante, 2022

 

20 fevereiro 2024

Feuerbach, Ludwig

Ludwig Andreas Feuerbach (1804-1872), desde a juventude, teve sua vida marcada pelas questões religiosas. Quarto filho do célebre jurista Paul Anselm Feuerbach, ele nasceu na cidade bávara de Landshut, em 1804, onde cresceu em um ambiente da alta burguesia e cedo desenvolveu interesses intelectuais. Sua vida melhorou, em 1837, depois que se casou com Berha Löw, filha de um rico industrial.

Hegel afirmava que a filosofia e a teologia tratam do mesmo tema: a realidade representa uma ordenação regular, permeada pela razão, descrita metaforicamente na religião cristã revelada e totalmente acessível a um conhecimento racional. Feuerbach teve conhecimento dessa filosofia. Além disso, Daub, em sintonia com a tese hegeliana, ensinava que todos os milagres bíblicos e os dogmas eclesiásticos podiam ser racionalmente justificados. Tudo isso o desencorajou da aspiração profissional de se tornar pastor.

Com sua obra A essência do cristianismo, Ludwig Feuerbach explica porque a religião é humana e Deus não é o criador dos homens, mas, em vez disso, os homens são seus criadores. No último capítulo de seu livro escreve: “Demonstramos que o conteúdo e o objeto da religião são totalmente humanos, que o mistério da teologia é a antropologia e o do ser divino, o ser humano”.

Em A essência do cristianismo, demonstra o seu propósito terapêutico de libertar os homens das projeções do além e das ilusões, bem como de fixar a religião naquele que, segundo sua opinião, é o seu lugar: o coração e o ânimo do homem. Foi a partir do estudo de Hegel que Feuerbach desenvolveu a rejeição à existência do além e a convicção de que Deus e o mundo formam uma unidade.

Em se tratando da imortalidade, dizia que esta poderia existir apenas para o espírito humano como um todo, portanto, para o gênero, mas não para o indivíduo.

Para Feuerbach, toda a religião é uma antropologia invertida. Segundo ele, as qualificações de Deus nada mais são do que as ideias tipicamente humanas. Deus é onisciência, porque conhecer e saber são valores imensamente apreciados pelo gênero humano; é amor, porque todos nós amamos e gostaríamos de amar mais; é justiça, porque essa é a virtude de que mais sentimos falta.

Fonte de Consulta

ZIMMER, Robert. O Portal da filosofia: Uma Breve Leitura de Obras Fundamentais da Filosofia Volume 2. Tradução Rita de Cassia Machado e Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2014.



07 fevereiro 2024

Platão e a Religião

Platão (428-348 a.C.), filósofo grego da antiguidade, trouxe-nos os ensinamentos sobre as Formas, os Modelos, a Cidade ideal etc. Ele discorria sobre as Formas perfeitas, que estão no além que, para nós, poderia ser denominado de "mundo espiritual", ou "mundo inteligível". Na base de seu raciocínio encontra-se a dialética, regida pela razão.

As notas abaixo foram extraídas do livro de Victor Goldschmidt

A dialética pode ser entendida como a arte de descobrir as semelhanças e as diferenças entre as Formas. Para Sócrates, dialética é uma pesquisa em comum. Impossível discuti-la se um dos interlocutores pretende deter a verdade e recusa, de vez, ser refutado. A razão adere à verdade, enquanto a paixão se atém à sua verdade. Não tendo com quem discutir, a pessoa poderá dialogar consigo mesma. Única coerção permitida: obrigar seu parceiro à pesquisa e à sinceridade.

Toda religião tende ao conhecimento do Ser que nos ultrapassa e em relação ao qual experimentamos um sentimento de “dependência absoluta”. Em Platão, a religião confunde-se inteiramente com a dialética. O artesão divino modela o Universo à semelhança do Modelo. O Modelo existe em si, ele é Ser que se basta, como o Bem se basta. A inteligência que conhece o Bem, que conhece o Modelo, se basta, no seu conhecimento.

Poder-se-ia perguntar: por que Sócrates prefere a morte à evasão? Porque é impossível conhecer a Forma do Bem sem imitá-la. Nesse sentido, não devemos atribuir a “submissão ao julgamento”, pelo qual qual foi condenado, à alta moralidade de Sócrates. Porém em relação ao Bem, ela é sujeição absoluta e exclui toda escolha.

O problema do Mal. O Universo é ora governado, ora abandonado por Deus. “Tudo o que nasce está sujeito à corrupção”, a Cidade ideal, as plantas, os animais. Tampouco a matéria é “má”. Ela é “ausência de Deus” e é ignorância de Deus. A ignorância no homem torna-se esquecimento. É pelo esquecimento que se altera a Cidade ideal, que as almas se condenam à Encarnação, que o Universo do mito se encaminha para o “oceano de diferença”.

Platão recusa-se a considerar a nossa atual existência como um mal. A única questão que preocupa Platão é a justiça. A felicidade vem por acréscimo. Fazendo o mal, a alma faz mal a si própria. Os tiranos que se reencarnam em corpos de lobos, têm a infelicidade de ver atendido seu desejo do mal.

A alma encarnada que hauriu sua felicidade unicamente na prática da filosofia e da justiça é digna de uma única recompensa: a visão permanente das realidades eternas. O culpado será confrontado com suas faltas; a alma purificada será posta em presença das realidades às quais ela se tornou semelhante.

Na tradição dos tempos, recuados ou na fonte, sempre a jorrar, do oráculo de Delfos, a Divindade revela-nos os processos pelos quais a Razão persuade a Necessidade e lhe impõe uma ordem estável. Entre as tradições, as mais veneráveis concernem a Religião. Já a República, entretanto construída unicamente segundo as exigências do Bem, fez o estabelecimento da religião depender, não da dialética, mas da tradição e do oráculo de Delfos.  

A aceitação da tradição, tão pouco conforme ao espírito dialético, que rejeita toda a autoridade, tem um lugar importante na “religião de Platão". É em favor da religião que se opera aqui a transmutação dos Valores que a dialética produz na alma humana.

O culto oficial, a educação cívica e a vida política inteira concorrem assim para livrar os cidadãos de sua falsa individualidade e para libertar neles essa parte que se não reconhece senão em face de Deus. A religião das Leis realiza, para cada um dos cidadãos, uma obra exatamente análoga àquela que a dialética opera na alma dos filósofos.  

De fato, por sua inversão de valores, a dialética proclama que somente a ciência de Deus, não as ciências do homem, merece "preocupar-nos". A supremacia da razão é afirmada contra a inspiração e contra o iluminismo sob todas as suas formas; mas, no entanto, a razão acolhe o mito.

Fonte de Consulta

GOLDSCHMIDT, Victor. A Religião de Platão. Tradução de Ieda e Oswaldo Porchat Pereira. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1970.

 


29 janeiro 2024

Mente e Experiência

F. A. Hayek disse que “a mente nunca pode prever o seu próprio avanço”. A razão é simples: o crescimento de nossa mente está ligado ao “progresso da civilização”.  Observou, também, que nossa capacidade de raciocinar não é “independente da experiência”.

Em se tratando da mente humana, muito podemos aprender com o estoico Marco Aurélio que, em seu livro Meditações, anotações de suas próprias experiências, deixou-nos uma infinidade de frases, pensamentos e sugestões úteis para o nosso bom relacionamento em sociedade

Assim, diante de um problema, de uma contradição, de um dificuldade, a nossa primeira reação, salvo raras exceções, é querer controlar o ocorrido.

Vejamos, porém, como Marco Aurélio diria:

“No início do dia, diga a si mesmo: encontrarei pessoas que são intrometidas, ingratas, abusivas, traiçoeiras, maliciosas e egoístas. Em todos os casos, elas ficaram assim por causa de sua ignorância sobre o que é bom e o que é mau”. Mesmo que o operador do transporte público e o caixa do banco sejam maliciosos, a nossa experiência do mundo pode ser enriquecida, pois ela não é determinada por esses protagonistas. 

Este alerta não é para ignorarmos o mau comportamento dos outros, mas para colocarmos lentes mais amplas nele. Isto faz-nos ver a maldade e a bondade como elas realmente são; daí, sabermos o que é moralmente bom ou moralmente mau.

Platão, na antiguidade, já nos falava do Verdadeiro, do Bem e do Belo. Quando nos predispomos a refletir sobre esses valores, percebemos que o seu contrário é transitório e quando o pensamento percebe o que é certo acaba naturalmente combatendo o erro.