15 agosto 2012

Autoconhecimento

autoconhecimento, embora tenha por objetivo a perfeição do ser humano, visa, em última instância, a exortação da gnose (onde gnothi seauton significa “conhece a ti mesmo”) não passa de um escapismo segundo Martin Burckhardt, em “Pequena História das Grandes Ideias”. Como se explica?

Burckhardt parte da pressuposição de que esta célebre frase começa com uma tragédia, que é o enigma apresentado pela esfinge ao rei Édipo, que pergunta: “Quem pela manhã anda sobre quatro pernas, à tarde sobre duas e à noite sobre três?” A resposta é: bebê que engatinha de quatro, o adulto que fica de pé e o velho que anda de bengala. Ele diz: “Se Édipo conseguisse tirar a esfinge do pedestal com a solução do enigma e livrar Tebas da tirania do monstro, precisaria mais tarde pagar um preço alto por isso. O desejo de autoconhecimento obriga Édipo a enfrentar sua própria culpa. O que ele vê é tão insuportável que o leva a cegar-se com a espada”.

A história do Édipo é um exemplo da corrente de pensamento que se denominava como gnose ou gnosticismo. Como a gnose, porém, passa a ser um escapismo? Quando ela se torna uma religião da razão. Entre os pitagóricos, os números eram a origem de todas as coisas. Os gnósticos não se contentam com a afirmação de Platão de que somos sombra do mundo espiritual. Para eles, o paraíso é aqui e agora. Mas, se é assim, como o ser humano desceu ao vale de lágrimas?  

Diante dessa pergunta, que não mais gira sobre o autoconhecimento, mas sobre a estilização como anjo, entram em cena as duas forças que se combatem: de um lado o ser espiritual, racional e puro; do outro, a carne pecadora. Como se pressupõe que a carne é fraca, quer-se encontrar o vilão de todos os pecados. Daí, o demoníaco, diabolon, antítese da divindade.

Para defender a pureza angélica, os gnósticos de todos os tempos inventaram teorias que davam sustentação aos seus anseios. Muitos gnósticos negaram a corporeidade de Jesus, imputando-lhe um corpo astral. Valentim (c. 160 d.C.) dizia: “Jesus comia e bebia de forma especial, sem excretar a comida. Tão grande era a força de seu poder de evitar a excreção que os alimentos não apodreciam nele, pois ele mesmo era indefectível e incorruptível”. 

Compilação sobre mente rígida e autocrítica: https://sites.google.com/view/temas-diversos-compilacao/mente-r%C3%ADgida-e-autocr%C3%ADtica



10 agosto 2012

Lógica

"Podemos ter a imaginação como companheira, mas devemos seguir a razão como nosso guia." (Samuel Johnson) 

Lógica — do grego logos significa “palavra”, “expressão”, “pensamento”, “conceito”, “discurso”, “razão”. Para Aristóteles, a lógica é a “ciência da demonstração”; Maritain a define como a “arte que nos faz proceder, com ordem, facilmente e sem erro, no ato próprio da razão”; para Liard é “a ciência das formas do pensamento”. Poderíamos ainda acrescentar: “É a ciência das leis do pensamento e a arte de aplicá-las corretamente na procura e demonstração da verdade.

A filosofia, no correr dos séculos, sempre se preocupou com o conhecimento, formulando a esse respeito várias questões: Qual a origem do conhecimento? Qual a sua essência? Quais os tipos de conhecimentos? Qual o critério da verdade? É possível o conhecimento? À lógica não interessa nenhuma dessas perguntas, mas apenas dar as regras do pensamento correto. A lógica é, portanto, uma disciplina propedêutica.

Aristóteles é considerado, com razão, o fundador da lógica. Foi ele, realmente, o primeiro a investigar, cientificamente, as leis do pensamento. Suas pesquisas lógicas foram reunidas, sob o nome de Organon, por Diógenes Laércio. As leis do pensamento formuladas por Aristóteles se caracterizam pelo rigor e pela exatidão. Por isso, foram adotadas pelos pensadores antigos e medievais e, ainda hoje, são admitidas por muitos filósofos.

O objetivo primacial da lógica é, portanto, o estudo da inteligência sob o ponto de vista de seu uso no conhecimento. É ela que fornece ao filósofo o instrumento e a técnica necessárias para a investigação segura da verdade. Mas, para conseguirmos atingir a verdade, é preciso raciocinarmos com exatidão e partirmos de dados exatos, a fim de que o espírito não caia em contradição consigo mesmo ou com os objetos, afirmando-os diferente do que, na realidade, são. Daí as várias divisões da lógica.

Assim sendo, a extensão e compreensão do conceito, o juízo e o raciocínio, o argumento, o silogismo e o sofisma são estudados dentro do tema lógica. O silogismo, que é um raciocínio composto de três proposições, dispostos de tal maneira que a terceira, chamada conclusão, deriva logicamente das duas primeiras chamadas premissas, tem lugar de destaque. É que todos os argumentos começam com uma afirmação caminhando depois por etapas até chegar à conclusão.

Estudemos a lógica, pois não basta conhecer a verdade, é preciso que saibamos refutar os erros. E só o conseguiremos com a exatidão do pensar.

Complemento

Em Platão, temos muitos conceitos religiosos e quase esotéricos. Aristóteles, ao contrário, é um racionalista que procura livrar o pensamento de todos os vestígios míticos. A purificação do pensamento está embasada em sua Lógica. Historicamente, a lógica é precedida pela antilógica, a disciplina que os sofistas batizam como a arte da contradição (antilogike techné). Para Aristóteles, a sabedoria sofista era aparente, irreal, e o sofista ganhava dinheiro com uma sabedoria de aparências, não com a verdadeira. 

Tencionando separar a sabedoria verdadeira da sabedoria aparente, Aristóteles lança o seu Organon, em que esclareceu com maior exatidão o que nos parece quase natural (há entendimento ativo ou passivo, há essência e acidente, etc.), diferenciações que nunca haviam sido feitas antes. Tornou claro o são identidade e casualidade, o que é uma dedução, entre outros. 

Kant pode dizer mais tarde que a lógica desde Aristóteles "não conseguiu avançar nenhum passo, parecendo, dessa forma, finalizada e perfeita em todos os sentidos"  

Este complemento foi extraído de: BURCKHARDT, Martin. Pequena História das Grandes Ideias: Como a Filosofia Inventou nosso Mundo. Tradução de Petê Rissatti. Rio de Janeiro: Tinta Negra Bazar Editorial, 2011.

Extraído do livro Use a Lógica, de D. Q. Mclnerny

Ser uma pessoa lógica pressupõe ter sensibilidade à linguagem e capacidade para usá-la efetivamente, pois lógica e linguagem são inseparáveis. Muitos erros de raciocínio são explicados pelo fato de não prestarmos atenção suficiente à situação em que nos encontramos. Por isso, deveríamos ir direto aos fatos que, objetivamente, podem ser: coisas ou acontecimentos. 

Deveríamos distinguir três componentes básicos no conhecimento humano: primeiro, o fato objetivo (um gato); segundo, a ideia de gato; terceiro, a palavra que usamos para essa ideia, que permite a comunicação (por exemplo, em português, “gato”).

Para uma comunicação eficaz, há algumas diretrizes:

Não suponha que a audiência entende sua intenção se você não deixa isso explícito.

Use frases completas.

Não trate as proposições avaliativas como se fossem proposições de um fato objetivo.

Evite duplicar as negativas.

Prepare a linguagem para a sua audiência. 

 

03 agosto 2012

Ilusão da Mudança

Ao longo do tempo, arquivamos muitas informações e experiências em nosso subconsciente. Nele estão gravados os nossos hábitos e automatismos, tanto bons quanto ruins. O subconsciente somente arquiva. Pode ser comparado ao hardware de um computador, que oferece condições para o funcionamento dos softwares.

Em se tratando do ser humano, devemos considerar o corpo físico e o corpo emocional. O corpo físico é composto de cabeça, tronco e membros. Cada um dos seus órgãos auxilia o funcionamento do todo. O corpo emocional é o que pensa, sente; tem afetividade. Para o corpo físico, o tempo transcorre linearmente, ou seja, uma hora depois da outra; para o corpo emocional, não há essa continuidade, pois para ele passado e presente estão ocorrendo simultaneamente.

Os nossos hábitos e automatismos estão gravados em nosso subconsciente. Por outro lado, estamos constantemente falando de mudança de comportamento. E por que é difícil essa mudança? Ou melhor, por que temos a ilusão da mudança? Recebemos uma informação e formamos uma “máscara” de progresso. Achamos que já vencemos aquele defeito, que não cometeremos mais aquela falta, que... Acontece que o nosso eu verdadeiro está preso ao subconsciente.

Pensamos que mudamos. Acontece que usamos máscaras, as quais conseguem esconder o corpo emocional, mas não conseguimos mudar o verdadeiro efeito que ele exerce em nossa vida.

Eis como Chris Griscom, em O Tempo é uma Ilusão, vê o problema:

“É quase impossível libertar-se dessa rotina cíclica, pois o corpo emocional está ligado ao corpo físico pelo centro do plexo solar. O centro de força do plexo solar estimula o sistema nervoso simpático, que funciona pelo princípio de “fugir ou lutar”. Quando percebemos algo que nos amedronta, os gânglios do plexo solar ficam estimulados e ativam uma mudança da composição química do sangue no cérebro. Isso, por sua vez, cria uma forma de estímulo elétrico com o qual o corpo emocional e o corpo físico vão se viciando cada vez que o episódio se repete. Com o tempo esse esquema se torna imperceptível e deixamos de percebê-lo diretamente, mas continuamos a executar o ciclo”.

Todo esforço tem a sua recompensa, mas se não mudarmos o fundo, tudo o mais não passa de ilusão de progresso, de evolução.  

 

Tradução e Mudança de Significado

Muitas são as palavras que tiveram o seu significado modificado quando passaram para outro idioma.  Eis algumas delas.

Conhece-te a ti mesmo. Em grego, gnothi seauton. Na época de Sócrates, esta frase pretendia estimular as pessoas a tomarem consciência de sua ignorância. Não é sem razão que Sócrates, ao lhe contarem que o oráculo de Delfos dissera que ele era o mais sábio dos homens, respondera: o oráculo disse isso, porque ele é o único que sabe que eu nada sei.  Em latim, nosce te ipsum. Conhecer-se a si mesmo passou a ser um processo de autoconhecimento, com perspectiva de uma mudança comportamental. Um exemplo: Santo Agostinho, todas as noites, repassava o dia para ver como fora em pensamentos, palavras e atos.

Deus Pai. Na mitologia grega, a palavra Zeus significa rei dos céus. Entre os romanos, foi traduzida por Júpiter, que passou a significar Deus Pai. Como o monoteísmo cristão evoca a figura de um único Deus, este também é o Deus Pai. É por esta razão que vemos o Pai como um velhinho de barbas brancas, sentado num trono. Deus, porém, não tem forma alguma. Como, contudo, convencer o crente a adorar algo que não tem forma?

Daimon.  Na época de Sócrates, daimon significava anjo da guarda, espírito protetor, que intervinha somente quando achava que Sócrates não devia fazer alguma coisa, ou seja, adverti-lo de um perigo iminente. Foi traduzido por demônio e, concomitantemente, ligado aos espíritos maus, pertencentes ao reino de Satanás.