01 julho 2008

Observação e Auto-Observação

Os limites da observação e auto-observação devem ser analisados em função do tempo, que no seu sentido objetivo flui uniformemente. Mas, e o sentido subjetivo? Quem melhor tratou a questão foi o Padre da Igreja, Santo Agostinho, que no 11º livro das suas Confissões escreve: "Quid est ergo "tempus"? Si nemo ex me quaerat, scio; si quaerenti expliare velim, nescio." (O que é afinal o "tempo"? se ninguém me pergunta, sei; se quero explicar a quem me pergunta, não sei). Quer dizer, devemos esquecer de definir o tempo e procurar ver como é que o homem chega ao tempo.

Para entendermos como o homem chega ao tempo, devemos valer-nos das janelas da simultaneidade e da não simultaneidade, às quais mostram-nos como podemos dizer que um acontecimento é um acontecimento. Experiências realizadas com os ouvidos, o tato e os olhos indicam que há um hiato de tempo entre o acontecimento e a percepção por esses órgãos de sentido. O ouvido leva de 2 a 5 milésimos de segundos, o tato, 10 e os olhos, 30. Além disso, há um tempo ainda maior para a perfeita identificação do acontecimento. Por exemplo, colocando-se um auscultador nos ouvidos de uma pessoa e emitindo som ora num ouvido e ora no outro, observou-se que a pessoa levou até 30 milésimos de segundos para a correta confirmação do som, em cada um dos ouvidos.

Outra experiência veiculada diz respeito à leitura. Pedindo-se para uma pessoa descrever o ato de ler, ela dirá que os olhos deslizam suavemente pela linha. Contudo, os olhos não deslizam suavemente, mas aos saltos. Aqui ocorre uma "ilusão temporal" ao contrário da "ilusão ótica", ou seja, embora os olhos caminhem aos saltos, temos a impressão de que ele desliza. Quer dizer, não percebemos os limites da velocidade dos olhos. Se alguém nos disser que é dessa maneira que a leitura ocorre, podemos até percebê-la dessa forma, porém, aí já não é leitura normal mas observação.

Ernest Pöppel, autor do livro, que trata das fronteiras da consciência, submeteu-se às próprias experiências. Lembra-nos, contudo, que embora o cientista queira ser imparcial, sempre estará limitado pela sua expectativa, o que pode influenciar os resultados dos experimentos, pois tudo o que corresponde às expectativas podem ser muito mais facilmente publicados. Quer dizer, embora ninguém queira participar algo errado de propósito, poderá fazê-lo inconscientemente.

De acordo com essas informações, devemos analisar os fatos criticamente, porque tudo o que parece verdadeiro, pode não o ser. A melhor forma de agir é contra argumentar, buscando sempre a verdade que pode estar além do meramente ocorrido. É somente com essa postura que podemos intuir algo de mais concreto no campo do espírito. Ainda assim, mesmo que tenhamos posse dessas verdades, convém exercitar a humildade, pois são muitas as coisas que os limites de nossa observação não nos deixam ver.

Tenhamos olhos para ver e ouvidos para ouvir. Não nos deixemos enganar pelas ilusões do momento que passa. Procuremos, sim, o acrisolamento do nosso olhar crítico, para que possamos observar os fatos com a maior imparcialidade possível.

Fonte de Consulta

PÖPPEL, E. Fronteiras da Consciência: da Realidade e da Experiência do Mundo. Lisboa, Edições 70, 1989.

25.07.97

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