A moral primitiva implicava a regulamentação do comportamento de
cada um de acordo com os interesses da coletividade. O indivíduo era mero
suporte, auxiliar na concretização dos objetivos do grupo. O comunismo
primitivo é um exemplo que vem ilustrar essa ideia. Lá não havia a família, tal
qual a conhecemos hoje, porque todos pertenciam ao grupo. Além do mais, toda
ação de autoconhecimento era uma ação voltada para melhoria do caráter, a
conquista das virtudes, disposições essenciais para a obtenção da sumo bem e da
felicidade eterna.
O homem moderno, influenciado pela filosofia de Descartes — buscar
Deus pela razão — perde a
orientação característica das sociedades tradicionais, e, desse modo, através
do individualismo, cada qual acaba buscando por si mesmo a sua própria
orientação na vida. Assim sendo, a autonomia do sujeito é buscar em si mesmo,
ou seja, nas suas forças interiores elementos para auto ajudar-se. Contudo,
esse culto à individualização fê-lo mais materialista e egoísta, contrariando
sobremaneira os ensinamentos evangélicos, que exortam a repartir com os outros
os bens adquiridos na vida.
O fenômeno da autoajuda teve início em meados do século XIX, no
momento em que se caracterizava o culto à singularidade do indivíduo moderno,
quando ele passa ter o valor central da cultura ocidental. Este fenômeno
coincide com o desenvolvimento das sociedades capitalistas — que se
caracterizam pela tecnologia de ponta, pelos grandes investimentos e pela
obtenção do lucro. O dinheiro acaba medindo tudo, inclusive o indivíduo. Quem
tem dinheiro tem status social, é bem sucedido, senhor de altos conhecimentos.
Destacando-se do grupo, pode incentivar outros a fazer o mesmo: é daí que surge
o individualismo que deteriora a vida comunitária.
O discurso de autoajuda, que é pronunciado pelos seus líderes,
possui uma "tonalidade" que encanta e fascina. De acordo com Arnaldo
Toni Sousa das Chagas, em seu livro A Ilusão no discurso da autoajuda e o sintoma social,
resultado de uma pesquisa nos vários livros de autoajuda, diz-nos que esses
pregadores de autoajuda, com a insolência inabalável de seus posicionamentos e
pelo discurso atrativo, acabam encaminhando os seus leitores ou ouvintes para
um caminho, onde tudo pode ser realizado, obtido, conseguido, como num passe de
mágica, pois basta querer, porque querer é poder. As incertezas, as dúvidas, os
questionamentos próprios do saber filosófico não fazem parte desse discurso.
O discurso de autoajuda pelo grau de autoridade e dogmatismo que
possui vem justificar os sintomas degradantes do vínculo social, principalmente
pelo enfraquecimento dos laços sociais e sua consequência para a vida
comunitária, em virtude da valorização dos bens de uso, de consumo, da
autonomia, da liberdade, em detrimento do amor ao próximo, da fraternidade do
auxílio mútuo, do fazer aos outros o que gostaríamos que nos fosse feito. Este
é o grande sintoma (egoísmo) que devemos combater. Esta é a chaga número 1 da
sociedade, mascarada pelos discursos de autoajuda.
Estejamos atentos: somos nós tão insensatos que tendo começado
pelo espirito acabaremos pela carne?
Fonte de Consulta
CHAGAS, A. T. S. das. A Ilusão no Discurso da Auto-Ajuda e o Sintoma Social. Rio
Grande do Sul, Unijuí, 1999.
Um comentário:
Amei saber
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