A astúcia — do grego métis — é
uma palavra carregada de contradições, dubiedades, paradoxos
e ambiguidades. Esta era a forma como os gregos procuravam transmitir
os seus conhecimentos, ou seja, através do mito, da ironia, da contradição, dos
volteios. Zenão, o fundador do estoicismo, não fugiu à regra. Para ele, o
filósofo-educador estoico tem muito a nos ensinar,
especialmente na distinção entre os ditos e feitos socrático-platônicos e
os veiculados pela filosofia da Stoa.
Há grande diferença entre a conceituação da métis, dada por Platão, e aquela, ensinada pelo
filósofo estoico. Em Platão, por exemplo, há o enfoque político-social,
em que a condução do Estado estaria nas mãos dos filósofos, mais preparados
para o exercício do poder. Zenão, não aceitava tal proposição; ele preferiu
aprofundar o enfoque ético-religioso, pois acreditava ser este o fundamento
maior da vida e da vivência do ser humano para o engrandecimento de sua alma.
O seu conceito de Estado e da economia difere da acepção grega.
Adepto da "sociedade sem estado", pois acreditava que havendo o
Estado haveria sempre os dominadores e os dominados. Por isso, não achava
necessário caracterizar a economia, como profano, e a religião, como sagrado,
pois tudo faz parte da physis. Em sua Politéia, diz: "Devemos considerar todos os homens ‘démotas’, e
que o modo de vida seja uno e a ordem una, como um rebanho que numa pastagem se
nutre em conjunto, segundo uma mesma lei".
Um paradoxo: os estoicos afirmavam que a alma é somatós (corpo), como o são a justiça e a virtude.
Qual o sentido filosófico que está por detrás dessa ambiguidade?
A palavra soma traz um substrato material, ou seja, a solidez. Para o
Pórtico, corpo é tudo o que age e padece, e o que age e padece pode ser,
também, sólido mas não somente sólido. Em outras palavras, o corpo age, mas não
o faz por si mesmo, ele necessita do espírito, o qual intelectualiza a matéria.
A afirmação de que tanto o sábio quanto insensato não precisa de
nada ou precisa de tudo, faz-nos também pensar. Em termos absolutos, o
insensato não precisa de nada, porque acha que sabe tudo e, por isso, não
procura instruir-se; o sábio, como já é conhecedor de tudo, não tem necessidade
de conhecimento. Relativamente, tanto um quanto o outro precisa sempre de
aprender algo novo, pois cada qual deve se enquadrar na lei natural do
progresso.
A reflexão sobre a astúcia estoica é providencial. Ela
mostra que o ser humano pode sempre avançar no conhecimento, porque tem cada
vez mais possibilidade de estruturar o novo.
Fonte de Consulta
GAZOLA. Rachel. O Ofício do Filósofo Estoico: O Duplo Registro do Discurso da
Stoa. São Paulo: Loyola, 1999. (Leituras Filosóficas)
Nenhum comentário:
Postar um comentário