Ao nos movimentarmos na vida
estabelecemos relações conosco mesmos e com o nosso próximo. Ao nos
relacionarmos conosco mesmos e com os outros criamos problemas. Os problemas,
de seu lado, nada mais são do que perturbações em nosso bem-estar. Eles podem
originar-se de uma doença, de um sofrimento psicológico, de um desejo
insatisfeito, do ódio, da injúria, do elogio etc. É sobre essa perturbação
momentânea que iremos refletir nas próximas linhas.
É válido querer saber a causa do sofrimento?
Não seria isso fugir dele? Quando queremos saber o porquê, isto é, se foi por
causa de nossa incúria, ou de uma encarnação passada, o que estamos tentando
fazer é aquietar o pensamento, dando-lhe um consolo. A atitude correta seria
tomar consciência do sofrimento, tentando entrelaçar observador e coisa
observada, pois se o sofrimento for analisado como se estivesse fora de nós,
dá-se a impressão de que ele não nos pertence, o que dificulta a percepção.
A mente gosta de embalar-se na ilusão.
Por que? Observe: geralmente atribuímos autodecepção aos nossos projetos de
vida. A decepção aparece porque estabelecemos um hiato entre o que é e
o que deve ser. Como todos nós queremos ser alguma coisa, porque o
nada nos aborrece e nos dá um sentimento de inutilidade, acabamos projetando um
devir acima do que é. Esta é a ilusão pela qual a maioria dos seres humanos é
vítima. Como não bastasse, acabamos transmitindo aos nossos descendentes.
Devemos atender à vontade de Deus ou
nos submetermos ao que é? Quando damos importância exagerada à vontade de Deus,
deixamo-nos guiar por uma ideia, que é alheia a nós. Refletir sobre
o que é é mais difícil. Temos que partir do nada, da nossa
insignificância e, através do pensamento, ir construindo um modo peculiar de
entender a realidade nua e crua. Lembremo-nos de que não existe nem o erro nem
a verdade; falsos ou verdadeiros são sempre os nossos juízos com relação à
realidade.
Qual a palavra mágica para a resolução
do problema? De acordo com Krishnamurti, a solução do problema está no
autopercebimento. O raciocínio é simples, mas de difícil aplicação. Temos de
tomar como se fosse nosso aquilo que se nos apresenta. Quer dizer, não devemos
fugir das admoestações, dos caminhos que temos de percorrer e das perturbações
que temos de passar. É refletindo sobre o que vem à mente, sem censura ou outro
subterfúgio, que conseguiremos aquietar o nosso cérebro para a real percepção
do problema e sua consequente solução.
Tenhamos coragem de olharmos para
dentro de nós mesmos. Somos o que somos. De nada adianta fazermos uma imagem
que não corresponda ao que é.
Fonte de Consulta
KRISHNAMURTI, J. A Primeira e a
Última Liberdade. Tradução por Hugo Veloso. São Paulo, Cultrix, 1960.
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