05 abril 2020

Gênero e Espécie

Os nossos sentidos são a base da abstração: eles captam apenas uma parte da realidade: a vista apreende a forma dos objetos; o ouvido, os sons; o olfato, os odores. A razão, por seu turno, não só elabora os conceitos; ela os compara, encaixa-os uns nos outros, dá-lhes uma hierarquia quantitativa, os reduz a conteúdo e continente, classificando-os.

A razão ordena os objetos singulares nas espécies, estas nos gêneros mais vastos, até atingir o gênero supremo, o abstrato mais abstrato de todos os abstratos, que é o conceito lógico do ser. Na classificação, há ordem, clareza, simplicidade e unidade. Daí, a afirmação de que toda classificação é uma redução à unidade. Nota: o conceito lógico do ser não deve ser confundido com o conceito ontológico. Se o primeiro é uma abstração, o segundo tem outra realidade, a máxima realidade.

Em se tratando dos conceitos, os mais vastos contêm os mais singulares. À proporção que subimos dos singulares às espécies, e destas aos gêneros, aumentamos a compreensão, mas diminuímos os conteúdos. Em outros termos, a compreensão é o conjunto de caracteres de um objeto; a extensão, o maior ou menor número de objeto a que o conceito pode ser aplicado. Daí o princípio: quanto maior a compreensão, menor é a extensão, e inversamente. Exemplificando: a compreensão do cão (animal domesticado) deve estar relacionada com a extensão do simples animal.

Razão e visão têm as suas semelhanças: tentando ver mais coisas, perdemos delas os pormenores; do mesmo modo a razão: tentando abranger mais conceitos deixa os pormenores em segundo plano. Estabelecida a hierarquia pela classificação, segue a razão um caminho inverso: do mais geral ao menos geral, e deste ao singular. Temos, então, a definição. (1)

Toda realidade pode ser caracterizada em termos de gêneros e de espécies em virtude de várias diferenças específicas. Eis uma parcela da clássica divisão da realidade, mais conhecida como a Árvore de Porfírio a partir do filósofo neoplatônico Porfírio:



Cada palavra ou expressão em maiúsculas designa um gênero ou espécie. Cada item imediatamente abaixo de outro é uma espécie em relação ao item imediatamente acima de si; e cada item que tem itens imediatamente abaixo de si é um gênero com relação a esses itens. O ser é o mais elevado gênero que existe; ele não é uma espécie de coisa alguma. Os seres humanos [no ramo da extrema esquerda] são uma espécie das mais inferiores; não são gênero de coisa alguma. Logo, os termos gênero espécie são relativos. Um gênero é sempre uma categoria mais geral com relação às espécies. (2)

(1) SANTOS, M. F. dos. Convite à Filosofia e à História da Filosofia. 6. Ed., São Paulo: Logos., item "Gênero e Espécie". 

(2) MARTINICH, A. P. Ensaio Filosófico: o que é, como se faz. Tradução de Adail U. Sobral. São Paulo: Loyola, 2002.



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