12 junho 2019

Inutilidade: Busca Desinteressada do Saber

O "útil" caracteriza-se pela intermediação, vale por tudo aquilo a que se dirige, não por si mesmo. A criação e a renovação constante são seus atributos. O "inútil", em se tratando de um fim em si mesmo, caracteriza-se pela perfeição e pela liberdade. Nesse sentido, a existência lúdica, a estética e a especulação intelectual desinteressada tornam-se uma necessidade, porque distanciam-nos dos aspectos práticos da vida. A contemplação de uma boa música ou de uma obra de arte pode levar-nos ao êxtase.

Na antiguidade, a busca do saber não visava o lucro, mas a apreensão da verdade. Para tanto, basta recordar as vivências de Sócrates, Platão e Aristóteles. Sócrates, com sua ironia e maiêutica, criava contradição naqueles que se julgavam donos da verdade. Platão, no Teeteto, diz que os "homens livres" não têm problemas com o tempo, enquanto os "escravos" estão condicionados por um patrão que decide. Aristóteles, por sua vez, afirmava que é pela admiração que os indivíduos se põe a filosofar, e que em seus níveis mais elevados o conhecimento não é "uma ciência prática". 

Há, ao longo da história, outros pensadores que enalteceram a livre busca do conhecimento. Em Nova Atlântica (1627), Francis Bacon enfatiza que os seus ilhéus não mantinham o comércio para obter lucro, mas somente para "aumentar o conhecimento".  Shakespeare, em O Mercador de Veneza, no reino de Belmonte, mostra que o ouro e a prata são desprezados. Para Kant, o desinteresse atingirá também o juízo estético. Martin Heidegger, refletindo sobre a essência da obra de arte, diz: "O mais útil é o inútil. Mas experienciar o inútil é o mais difícil para o homem moderno."

A maioria das universidades, hoje, está reduzindo os níveis de dificuldade a fim de permitir que os estudantes passem nos exames com maior facilidade. Muitas delas estão cortando as verbas dos cursos que não dão retorno financeiro, e deixando cada vez esquecidos os autores clássicos da filosofia. Há, contudo, um problema, pois muitas descobertas se deram no campo do desinteresse. Basta consultar a vida de alguns grandes cientistas: estes não foram movidos pelo lucro, mas por seus insights, por sua missão humanitária.

A produção técnica tem o seu valor, ou seja, fornece-nos o conforto do lar, a facilidade da comunicação, a locomoção rápida pelas grandes aeronaves... Contudo, não nos esqueçamos que a vida, na sua essência, transcende tudo isso.

Fonte de Consulta

ORDINE, Nuccio. A Utilidade do Inútil: Um Manifesto. Tradução de Luiz Carlos Bombasaro. Rio de Janeiro: Zahar, 2016.

 

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