Um gênio maligno pode tentar me
fazer acreditar em
coisas falsas.
Não há nada do qual posso ter certeza.
Mas quando digo "Eu sou, eu existo", não
posso estar errado sobre
isso.
Um gênio maligno poderia tentar me fazer acreditar
nisso se eu realmente existir.
Penso, logo existo. (2)
O ponto de partida para Descartes é a busca pelas
certezas, o que nunca é uma questão fácil, como ele percebe, uma vez que os
sentidos podem ser enganados. O método que ele propõe é conhecido como dúvida
hiperbólica - "hiperbólica" no sentido de "extrema". Assim,
para testar o quanto o nosso chamado "conhecimento" está fundamentado
na razão, é preciso suspender o julgamento sobre qualquer proposição cuja
verdade possa de alguma forma ser questionada. Por meio de um processo
eliminatório, Descartes chega à sua célebre conclusão: Cogito, ergo sum ("Penso, logo exito"). Ele tem
certeza da sua própria existência, pois caso contrário não estaria pensando.
Descartes então se detém sobre o que está pensando, identificando entre
outras coisas a ideia de um Ser Perfeito ou Deus. Ele tem certeza de se tratar
de uma verdade e de ela existir fora de sua mente, pois de outro modo o cogito em si não seria verdadeiro. Embora isso
soe novamente como escolástica, dessa vez o Ser Perfeito ajuda a provar a
solidez do raciocínio humano: ele é Deus "em quem estão escondidos todos
os tesouros da sabedoria e da ciência". Como Deus leva Descartes a
acreditar que as coisas no mundo externo são materiais, é porque devem mesmo
ser, visto que um Deus perfeito jamais o enganaria. Esse dualismo - nada menos
que dualismo cartesiano: a divisão entre mente pensante, não material, e o
corpo mecânico, material - é algo que continua a provocar interesse até hoje.
Descartes sofreu críticas desde o início, mas
quando a rainha Cristina da Suécia decidiu, em 1649, que queria ter aulas de
filosofia, acabou por convocá-lo. Infelizmente, para ele a empreitada não foi
bem-sucedida. Para início de conversa, Cristina gostava de começar o estudo às
cinco da manhã, apesar de estarem em meados de inverno, ao passo que o tutor
preferia uma manhã tranquila na cama, para ler e refletir um pouco mais. O
resultado é que apenas seis meses após a chegada ele morreu de pneumonia. (3)
(1) JERPHAGNON, L. Dicionário das Grandes Filosofias. Lisboa, Edições 70, 1982.
(2) VÁRIOS COLABORADORES. O Livro da Filosofia. Tradução de Rosemarie Ziegelmaier. São
Paulo: Globo, 2011.
(3) LEVENE, Lesley. Penso, Logo Existo: Tudo o que Você Precisa Saber sobre
Filosofia. Tradução de Debora Fleck. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013.
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Origens do cogito [Caixa]
Cogito ergo sum talvez
seja a mais conhecida de todas as frases filosóficas, mas sua origem precisa
não é certa. Embora esteja inextricavelmente ligada a Descartes, a ideia por
trás do cogito é anterior a ele. No início do século
V d.C., por exemplo, Santo Agostinho escreveu que podemos duvidar de tudo,
exceto da dúvida da própria alma, e essa ideia o precede. (Dupré, Ben. 50
ideias de filosofia que você precisa conhecer / Ben Dupré; tradução Rosemarie Ziegelmaier.
- 1. ed. - São Paulo: Planeta, 2015.
3 comentários:
Top demais. parabéns pelo trabalho.
O ser pensante, em Descartes, complementa o ser material. Tudo na matéria, nos sentidos , é aparente, imperfeito. O conhecimento pleno, essencial das coisas é dado pelo intelecto. O exercício do pensamento dá sentido e maturidade à minha existência.
Meu ser pensante aperfeiçoa o meu ser material, na medida em que aperfeiçoa minha interpretação e construção da realidade, cuja observação empírica, sensorial é imperfeita.
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