Autor: João Branquinho
BRANQUINHO, João, MURCHO, Desidério e GOMES, Nelson Gonçalves. Enciclopédia de Termos Lógico-Filosóficos. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
Ambiguidade
Do latim ambiguitas, duplo sentido. Duplo sentido de uma palavra
ou de uma expressão. Não deixar claro o sentido de uma palavra ou de uma frase
que podem ser interpretadas pelo menos de duas maneiras diferentes.
Uma expressão é ambígua, quando se encontra associada a mais de um
significado. A ambiguidade é, por conseguinte, o tipo de relação entre forma e
significado recíproca da relação de SINONÍMIA.
Os seguintes exemplos ilustram diferentes tipos de ambiguidade respectivamente, ambiguidade lexical, estrutural e de âmbito. 1) “O Pedro escolheu o canto”; 2) “O Pedro viu a Maria com os binóculos”; 3) “Todas as pessoas são amadas por alguém.
No exemplo 1 a ambiguidade resulta de a palavra “canto” poder ser
interpretada como designadora ou de determinado lugar em um espaço interior ou
de certa atividade musical: a frase 1 pode ser usada, p.ex., para informar acerca
do lugar que o Pedro escolheu para se sentar, pode informar acerca da
demonstração de perícia que o Pedro escolheu em um concurso televisivo.
Em 2 a ambiguidade resulta da posição relativa em que o sintagma “com
binóculos” ocorre na frase. Essa frase pode ser interpretada como se
descrevesse a situação em que Pedro usou os binóculos para ver a Maria ou como
descrevendo a situação em que a Maria levava os binóculos quando o Pedro a viu.
Repare-se que, colocando o referido sintagma em outra posição relativa, no
início da frase, p. ex., a frase resultante deixa de apresentar essa
ambiguidade: “Com os binóculos, o Pedro viu a Maria”, descreve apenas a
primeira das duas situações referidas.
O exemplo 3 ilustra um caso de ambiguidade que resulta da co-ocorrência na mesma frase de mais de um determinante quantificacional. A frase 3 pode ser interpretada como se descrevesse a situação em que cada pessoa é amada pelo seu amante, ou como descrevendo a situação em que existe um amante universal que ama todas as pessoas.
Argumento de
autoridade
Um argumento baseado na opinião de um especialista.
Os argumentos de autoridade têm geralmente a seguinte forma lógica (ou são a
ela redutíveis): a disse que P; logo, P.
exemplo: “Aristóteles disse que a Terra é plana; logo, a Terra é plana”. Um
argumento de autoridade pode ainda ter a seguinte forma lógica: “Todas as
autoridades dizem que P; logo, P”.
A maior parte do conhecimento que temos de física,
matemática, história, economia ou qualquer outra área baseia-se no trabalho e
opinião de especialistas. Os argumentos de autoridade resultam dessa
necessidade de nos apoiarmos nos especialistas. Por isso, uma das regras a que
um argumento de autoridade tem de obedecer para poder ser bom é esta: 1)
o especialista (a autoridade) invocado tem de ser um bom especialista da
matéria em causa. Essa é a regra no seguinte argumento de autoridade: “Einstein
disse que a maneira de acabar com a guerra era ter um governo mundial; logo, a
maneira de acabar com a guerra é ter um governo mundial.” Dado que Einstein era
um especialista em física, mas não em filosofia política, esse argumento é mau.
Contudo, apesar de Marx ser um especialista em
filosofia política, o seguinte argumento de autoridade é mau: “Marx disse que a
maneira de acabar com a guerra era ter um governo mundial; logo, a maneira de
acabar com a guerra é ter um governo mundial.” Nesse caso, é mau porque viola
outra regra: 2) Os especialistas da matéria em causa não podem discordar
significativamente ente si quanto à afirmação em causa. Dado que os
especialistas em filosofia política discordam entre si quanto à afirmação em
causa, o argumento é mau.
Os seguintes argumentos contra Galileu são
igualmente maus. “Aristóteles disse que a Terra está imóvel; logo, a Terra está
imóvel” e “A Bíblia diz que a Terra está imóvel; logo, a Terra está imóvel.” O
primeiro é mau porque nem todos os grandes especialistas em astronomia, entre
os quais contava o próprio Galileu, concordaram com Aristóteles — o argumento
viola a regra 2. O segundo é mau porque os autores da Bíblia não eram
especialistas em astronomia — o argumento viola a regra 1.
Usa-se muitas vezes a expressão “argumento de autoridade” como sinônimo de “Argumento mau de autoridade”. Todavia, nem todos os argumentos de autoridade são maus; o progresso do conhecimento é impossível sem recorrer a argumentos de autoridade; e podem-se distinguir com alguma proficiência os bons dos maus argumentos de autoridade, atendendo às regras dadas.
Citação
O dispositivo principal para distinguir o uso de uma palavra da sua
menção. Na frase anterior a palavra "dispositivo" foi usada, mas
agora acabou de ser citada ou mencionada, por meio do uso de aspas. Em
português, o itálico é por vezes usado como dispositivo de citação; as aspas
são, no entanto, preferíveis, pois permitem citações encaixadas, ao contrário
do itálico ("A frase 'O nome de João é 'João' e tem quatro letras' é
verdadeira"). Ver uso/menção
Conhecimento
Um dos temas epistemológicos mais recorrentes e sobre o qual foi
manifestado razoável acordo entre filósofos modernos é o do caráter dualista do
conhecimento, isto é, o fato de ele ser um composto por dados dos sentidos, de
um lado, e, de outro, por conceitos ou qualquer espécie de esquema formal
organizador daqueles dados.
Contradição
Em um sentido frequente do termo, uma frase ou uma proposição diz-se ser
uma contradição quando, por um lado, é falsa, e, por outro, a sua falsidade se
deve, de algum modo, a fatos de natureza puramente lógica, semântica ou
conceptual.
Contra-Exemplo
Um exemplo que demonstra a falsidade de uma proposição universal.
"Descartes era um filósofo e não era alemão" é um contra-exemplo a
"Todos os filósofos são alemães". Não há contra-exemplos a
proposições existenciais, como "Alguns filósofos são alemães".
A técnica da derivação em lógica conhecida como reductio ad absurdum
procede, segundo algumas versões, por meio da construção do chamado conjunto
contra-exemplo.
Exemplificação
Termo empregado na literatura lógico-filosófica e metafísica para
designar, em geral, a relação que se estabelece entre um PARTICULAR e um
UNIVERSAL apropriado. Numericamente o mesmo universal, p.ex., a qualidade da
Humildade, pode ter como exemplos particulares distintos, p. ex., Francisco de
Assis e Madre Teresa de Calcutá; e numericamente o mesmo particular, p. ex.,
Francisco de Assis pode ser um exemplo de universais distintos, p. ex., a
Tolerância e a Pobreza. Diz, p.ex., que Sócrates (um particular) exemplifica a
propriedade (ou atributo) de ter bebido a cicuta (um universal).
Falácia
É um defeito de raciocínio, um caso de non sequitur. Em geral,
esse defeito passa despercebido, criando assim a ilusão de se estar na presença
de um raciocínio correto. Essa ilusão pode ser partilhada, ou não, por quem
propõe o raciocínio e por aqueles a quem ele se destina. As falácias podem
afetar quer os raciocínios dedutivos, quer os indutivos.
O Que é uma Falácia. A noção de falácia é híbrida e tem aspectos
lógicos e aspectos psicológicos (ou sociológicos). As noções híbridas deste
tipo estão longe de ser pérolas conceptuais, mas revelam-se por vezes úteis
para fins pedagógicos e práticos . Não existe uma teoria geral das falácias,
nem uma classificação das falácias que seja consensualmente aceita.
No entanto, há bons "indicadores" do que não é uma falácia.
Uma falácia não pode ser identificada simplesmente com um raciocínio a partir
de premissas falsas, visto que raciocínios deste tipo podem ser, se dedutivos,
válidos, ou, se indutivos, fortes; e em qualquer dos casos não serão falaciosos
(ver argumento).
Leis do
Pensamento
De acordo com a tradição, as leis da identidade, da não-contradição e do
terceiro excluído constituem um conjunto de princípios lógicos aos quais deve
ser atribuído o estatuto de leis do pensamento.
A lei da identidade diz que qualquer objeto é idêntico a si mesmo. A lei
da não-contradição diz que a conjunção de uma proposição com sua negação é
invariavelmente falsa. A lei do terceiro excluído diz que a distinção de uma
proposição com sua negação é invariavelmente verdadeira.
Linguagem do
Pensamento
A tese da existência de uma "linguagem do pensamento" foi
apresentada pela primeira vez pelo filósofo norte-americano Jerry Fodor em The
Language of Thought, publicado em 1976. A ideia surge como uma consequência
natural da adoção da chamada "visão computacional da mente". Com
efeito, se os chamados processos cognitivos são, na realidade, processos
computacionais, e se um processo computacional consiste em uma manipulação
ordenada de símbolos, então os processos cognitivos presente em organismos
cognoscentes consistem em manipulações ordenadas de símbolos.
Lógica
Embora o termo "lógica" tenha sido usado em diversas acepções
no decurso da história da filosofia, é possível isolar seu sentido preciso por
meio da expressão "lógica formal". Ao longo de sua história, a lógica
formal tem se ocupado da análise de relações entre proposições com vista a uma
definição exata do conceito de DEMONSTRAÇÃO e, já mais recentemente, de
conceitos afins, como refutação, compatibilidade e confirmação, que em
princípio podem, no entanto, ser reduzidos ao conceito de demonstração.
Lógica
Dialógica
A lógica dialógica é fruto das ideias do matemático e filósofo alemão
Paul Lorenzen (1915-1994), professor em Erlangen entre 1962 e 1980. Estava
insatisfeito com as teses platônicas e o ideário intuicionista.
Vejamos um exemplo do jogo dialógico informal. Há o proponente e o
oponente
1. Proponente diz: — Todo vegetariano é pacífico.
2. Oponente diz: — Isso se aplica também a Hitler?
Proponente diz: — Se Hitler era vegetariano, então ele era pacífico.
Oponente diz: — Hitler era vegetariano.
Proponente diz: — Então, ele era pacífico.
Oponente diz: — Hitler era mesmo pacífico?
O proponente venceu esse diálogo? Não! Em 1, o proponente afirmou a sua
tese. Em 2, o oponente questionou aquela afirmação, perguntando se o pretenso
caráter pacífico dos vegetarianos também se aplicaria a Hitler. Em 3, o
proponente manteve a sua coerência, dizendo que Hitler seria pacífico, caso
fosse vegetariano. Em 4, o oponente mencionou um fato conhecido, ou seja, que
Hitler era vegetariano. Em 5, o proponente foi a uma afirmação ousada, que é
uma frase elementar. Em 6, o oponente duvidou da asserção do seu interlocutor,
o que obriga esse último a provar o que disse em 5. Ora, para tanto o
proponente terá de exibir registros históricos, documentos e outros elementos empíricos.
Na concepção dessa tarefa, ele fracassará, por razões conhecidas. Não há
vitória para o proponente, nesse caso. O proponente não vence esse
diálogo específico.
Opacidade
Referencial
Considerem-se as seguintes frases: 1) "Álvaro de Campos é o autor
de Tabacaria", 2) "Fernando Pessoa é o autor de Tabacaria".
Dado o fato de "Álvaro de Campos" ser um heterônimo de Fernando
Pessoa, e uma vez que a frase 1 é verdadeira, está garantido que a frase 2 é
igualmente verdadeira. O princípio lógico que garante a verdade 2 a partir da
verdade 1 é do fato de "Fernando Pessoa" e "Álvaro de
Campos" serem termos correferenciais chama-se substituição salva veritate.
Existem no entanto contextos em que essa lei já não pode ser aplicada.
Considerem-se as frase 3) "João acredita que Álvaro de Campos é o autor de
Tabacaria" e 4) "João acredita que Fernando Pessoa é o autor
de Tabacaria". Facilmente se verifica que, dada a verdade de 3, não
está garantida a verdade de 4. É que João pode não acreditar, por não ter
informação disponível, que "Álvaro de Campos" é um heterônimo de
Fernando Pessoa. Os contextos em que os princípios da substituição salva
veritate não pode ser aplicado são referencialmente opacos (e os contextos
em que ele pode ser aplicado chamam-se referencialmente transparentes)
Heteronímia (héteros = diferente; + ónoma = nome) é o estudo
dos heterônimos, isto é, estudo de autores fictícios (ou pseudo-autores)
que possuem personalidade. ... O criador do heterônimo é chamado de
"ortônimo". Sendo assim, quando o autor assume outras personalidades
como se fossem pessoas reais. (wikipedia)
Paradoxo
O termo "paradoxo" começou por significar "contrário à
opinião recebida e comum", mas as acepções díspares em que tem sido usado
pela tradição lógica e filosófica não permitem identificar um conjunto de
características ou de temas suficientemente coerentes para tornar esclarecedora
uma definição geral.
Um paradoxo lógico consiste em duas proposições contrárias ou
contraditórias derivadas conjuntamente a partir de argumentos que não se
revelaram incorretos fora do contexto particular que gera o paradoxo.
Paradoxo de
Electra
Não é um verdadeiro paradoxo, mas apenas o resultado de certos termos
por nós usados serem intencionais e não intencionais. O nome do
"paradoxo" deriva-se da situação em que Electra não sabe que o homem
que tem perante si é seu irmão, apesar de saber que Orestes é seu irmão e
apesar de esse homem que está perante si ser efetivamente Orestes (só que ela
não o sabe). Isso significa que estamos perante um contexto opaco e que Electra
não tem uma CRENÇA DE RE, mas sim de dicto.
Problema da
Mente-Corpo
Como a própria expressão indica, o "problema da mente-corpo" é
determinar as relações entre mente e corpo.
De um ponto de vista dualista, o que se procura elucidar é que espécie
de relação causal (se alguma) há entre essas duas substâncias; essa elucidação,
por seu lado, depende do esclarecimento do seguinte problema: como é possível
(se é que é de todo possível) que entre duas substância pertencentes a regiões
ontológicas distintas se possa verificar qualquer trânsito causal? (ver
dualismo)
Reductio ad
Absurdum
(Lat., redução ao absurdo) É um processo de inferência por meio do qual
se pode derivar uma proposição -X a partir do fato de uma hipótese X conduzir a
uma contradição. A ideia subjacente é a de que, se uma contradição pode ser
deduzida de uma proposição X, então X não pode ser verdadeira e pode-se por
isso afirmar -X. É um processo útil para derivar conclusões negativas. A
hipótese a partir da qual a contradição é derivada é conhecida por hipótese da reductio.
Semântica
1. Disciplina que tem por objetivo o estudo do significado. 2. A
semântica de uma língua, natural ou formal, é o conjunto de regras e princípios
de acordo com os quais as expressões dessa língua são interpretas. 3. A
semântica de dada expressão é o seu significado.
Uso/Menção
Considerem-se as seguintes frases: 1) "Camões é uma palavra";
2) "'Camões' é uma palavra". 1 é falsa e 2 é verdadeira. A diferença
consiste no fato de a palavra "Camões" ser usada em 1, mas mencionada
em 2. Distinguir o uso de uma palavra ou de uma frase da sua menção é crucial
para evitar falácias. P. ex.: "Todas as palavras são compostas por letras;
'Sócrates' é uma palavra; logo, Sócrates é composto por letras."
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