26 julho 2022

Aríston

“A virtude é a saúde da alma.” Aríston

Aríston, o desafiador (306 a. C.- 240 a. C.), natural de Assos, Quios.

Considerado um controverso discípulo rebelde, que por pouco não mudou por completo o rumo da filosofia estoica.

Cleantes era o aluno preferido de Zenão e, em 262 a.C., o sucessor escolhido por ele. Aríston era um filósofo igualmente promissor, e muito menos passivo e discreto. Foi apelidado de “sereia” pelo poder de encantar audiências, ao mesmo tempo que as desencaminhava.

Desafiador era uma alcunha mais apropriada, pois ele estava sempre questionando e minando muitos pontos da doutrina do estoicismo antigo, incluindo as suas regras práticas para o cotidiano.

Em que discordava? Do papel dos preceitos, ou regras práticas, que determinavam o que deveríamos ou não fazer, por exemplo, sobre casamento, criação dos filhos, insultos etc. Tais regras eram úteis, mas não passavam de muletas que impeliam as pessoas a seguir um roteiro para as dificuldades da vida.

Aríston queria que seus alunos se preocupassem com um único ponto, queria lhes oferecer uma estrela-guia: a virtude. A virtude era o único bem que não gerava confusão de espécie alguma. Tudo o mais não valia a preocupação. Pregava a total indiferença a tudo que estivesse entre a virtude e vício, sem quaisquer exceções.  

A escola de Aríston aboliu os tópicos de física e lógica. O primeiro estava além da nossa capacidade e o segundo não valia a pena. Apenas a ética importava, apenas a virtude.

Resumindo: esqueça os preceitos. Não fique refletindo sobre regras. Apenas faça. Na vida, o que importa são os momentos que nos aproximamos da virtude.

Fonte de Consulta

HOLIDAY, Ryan e HANSELMAN, Stephen. A Vida dos Estoicos: A Arte de Viver, de Zenão a Marco Aurélio. Tradução de Alexandre Raposo e Luiz Felipe Fonseca. Intrínseca, 2021. 

 


21 julho 2022

Ética Estoica

Na ética estoica, há a ausência das paixões, pois estas eram simplesmente o intelecto em um estado doentio, devido às perversões da falsidade. O intelecto, livre de perturbações, era o monarca legítimo, “o princípio do condutor” no reino do ser humano. Essa era a parte da alma que recebia as "fantasias", onde eram gerados os impulsos.   

O impulso era o princípio na alma que impulsionava para a ação. Em estado de ausência de perversão, era dirigido exclusivamente a coisas em harmonia com a natureza. A forma contrária chamava-se repulsão. Para os estoicos, “paixão” era definida como “um impulso excessivo”. Embora condenassem toda paixão, admitiam certas eupatias, ou paixões felizes, experimentadas pelos sábios.

Raciocínio para se chegar a Deus: ser feliz era ser virtuoso; ser virtuoso era ser racional; ser racional era acatar a natureza; e acatar a natureza era obedecer a Deus.

Paradoxos estoicosDizer que “a virtude é o supremo bem” é uma proposição feita por todo aquele que aspira a uma vida espiritual, mesmo que o faça de boca para fora. Alterando-se para “a virtude é o único bem”, transforma-se num paradoxo. Entende-se por "paradoxo" aquilo que contraria a opinião geral.

Outros paradoxos estoicos: “Todo insensato é louco”; “Somente o sábio é livre, e todo insensato é um escravo”; “Somente o sábio é rico”; “Pessoas boas são sempre felizes e pessoas más, sempre infelizes”. “Todos os bens são iguais”; “Nenhuma pessoa é mais sábia ou mais feliz do que a outra”.

A lei era definida como “a correta razão comandando o que era para ser feito e proibindo o que não era para ser feito”. Por isso, ela era sempre justa. 

Destaque: o sábio jamais perdoava porque nunca tinha algo para perdoar. Não podia ser atingido por nenhum dano enquanto sua vontade estivesse fixada na retidão, isto é, enquanto fosse um sábio: o pecador pecava contra sua própria alma.

Notas extraídas de: STOCK, George. O Estoicismo. Tradução de Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2022. (capítulo IV "Ética") 

17 julho 2022

Cérebro, Mente e Computador

A relação mente-corpo é estudada desde a Antiguidade. Coube, porém a Descartes a primazia de levantar o problema com mais ênfase. Em seu dualismo, afirma que a mente (res cogitans) e o corpo (res extensa) são formados de substâncias distintas, mas que ainda não tinha descoberto como uma é ligada a outra. Aventou a hipótese de a glândula pineal ser o intermediário. Contudo, mais tarde, dissera que o importante é saber que são distintos e isto basta.

O materialismo, oferecendo-nos uma série de dificuldades conceituais, contrapõe-se e abandona o dualismo cartesiano. Alguns pensadores materialistas, inspirando-se na lei de Leibniz, advogam a identidade entre cérebro e mente, ou seja, cérebro e mente não são distintos como afirmara Descartes, eles fazem parte da mesma substância. Como dão valor à matéria e não ao espírito, dificultam o entendimento da mente e da sua relação com o corpo, inclusive, chegando alguns a afirmar que a mente não existe porque a Psicologia não a definiu.

O surgimento do computador, e sua evolução através do tempo, trouxe como consequência mudanças radicais em todos os níveis de conhecimento. Física, Química, Biologia etc. A Filosofia da Mente, uma área aparentemente díspar da teoria computacional, também sofreu influência, principalmente através dos modelos computacionais em que se procura relacionar o software (programa de computação) com o hardware (a máquina), comparando-os com o relacionamento entre mente e cérebro.

A teoria computacional retoma as posições radicais entre o materialismo e o dualismo, procurando achar o meio termo entre ambas. H. Putnan, em “Minds and Machines”, artigo escrito em 1975, procura estabelecer uma correlação entre estados mentais (pensamentos) e software de um lado e entre os estados cerebrais e o hadware ou os diferentes estados físicos pelos quais passa a máquina ao obedecer as instruções. Esta teoria não esteve isenta de críticas. A principal delas é que a máquina é geral e não permite a individuação própria de cada mente humana.

Numa versão moderna, temos o funcionamento neuro-computacional ou conexionismo iniciado com os trabalhos de Von Neumann. Pretende-se, com esse sistema computacional, resolver a questão da individuação deixada no modelo de Putnan. De Acordo com esta teoria, estabelece-se uma relação específica entre o software e o hardware. Não há independência entre o software e o hardware e as características do design deste tipo de máquina permitem que, no limite, possamos conceber que cada estado mental (ou de software) corresponda a um estado cerebral (ou de hardware).

A teoria computacional deu novo dinamismo à pesquisa da mente, contudo o problema da ligação mente-cérebro ainda está por resolver. Falta-lhes a noção de PERISPÍRITO, elo entre a matéria e o espírito.

Fonte de Consulta

TEIXEIRA, J. de F. Filosofia da Mente e Inteligência Artificial. Campinas, UNICAMP, Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência, 1996. (Coleção CLE; v. 17)

05 julho 2022

Jean-Jacques Rousseau e "Emílio" (1762)

“Toda maldade vem da fraqueza. A criança só é má porque é fraca. Tornai-a forte, e ela será boa.” (Jean-Jacques Rousseau)

Rousseau quer educar as crianças partindo de sua naturalidade, sem ter sido impregnada dos vícios educacionais dos adultos. Ele queria educar o homem para que este se tornasse homem.

Emílio é uma mistura de tratado, romance e estudo de caso. Emílio é o nome do personagem principal, o aluno Emílio, objeto da experiência em educação. Emílio modificou fundamentalmente nossa opinião sobre os homens e se tornou a teoria da educação mais influente na história da filosofia. Mostra o que o homem pode se tornar quando é mantido distante das influências nocivas da sociedade.

Detalhes extraídos do livro:

Emílio é um garoto de origem aristocrática, portanto pode crescer livre de pressões sociais e materiais.

O educador está ao lado de Emílio e à disposição dele durante todo o dia. Os dois levam a mesma vida.

O educador não deve ser autoritário, e sim parteiro da natureza. Lema: learning by doing.

O homem deve aprender o que necessita e não aquilo que a convenção determina.

O primeiro entendimento do mundo passa pela “razão sensitiva”; por isso, o auxílio dos pés, das mãos e dos olhos.

Foi dos primeiros filósofos a dar ao papel das brincadeiras uma grande importância pedagógica.

Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, cumpre o papel que Rousseau esperava da literatura: que fosse didática e útil.  

O clássico lema do iluminismo, “Ousa fazer uso do teu próprio intelecto”, formulado por Immanuel Kant, foi diretamente extraído dos fundamentos pedagógicos de Emílio.

Rousseau pode ser considerado o pai da pedagogia moderna, fundada por Pestalozzi no fim do século XVIII. Sua filosofia influenciou também Rudolf Steiner, fundador da antroposofia, e John Dewey, principal teórico da educação do pragmatismo norte-americano.

Por trás das barreiras sociais, Rousseau descobre o homem natural e dá-lhe todas as condições de progredir segundo a sua necessidade.

ZIMMER, Robert. O Portal da filosofia: Uma Breve Leitura de Obras Fundamentais da Filosofia Volume 2. Tradução Rita de Cassia Machado e Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

03 julho 2022

Montesquieu e "Do espírito das leis" (1748)

Montesquieu (1689-1755), cujo nome verdadeiro é Charles-Louis de Secondat, um dos mais famosos cartógrafos da história da filosofia, foi um típico homme des letres de seu tempo. Sua educação aconteceu, primeiramente, sob o teto da Igreja católica. Depois de concluir a escola, iniciou a sua formação jurídica. Em 1713, contraiu matrimonio de conveniência com uma calvinista abastada e assumiu o vinhedo paterno. A sua fama maior refere-se à sua teoria da tripartição dos poderes.

Ainda: foi um filósofo político francês de formação iluminista e importante crítico da monarquia absolutista, bem como do clero católico.

Montesquieu foi um colecionador de fatos. Registrou-os no âmbito histórico e geográfico, que favoreceu a formação de diferentes constituições e instituições políticas. Para ele, existência é anterior às exigências da razão. 

Com Do espírito das leis, Montesquieu desenhou um mapa das culturas políticas, abrindo os olhos para o fato de que o sistema absolutista, preparado sob medida para o poder central do rei e que dominava sua terra natal, a França, não era a única nem a melhor alternativa de organização de um sistema político.

Do espírito das leis se dedica, grosso modo, a três diferentes temas: as diversas formas de governo e as relações que nelas se concretizam entre o cidadão e o Estado; os “fatores ambientais” sociais e naturais que influenciam a formação de uma constituição; e, finalmente, a questão sobre os modelos constitucionais existentes na história e quais lições podem ser tiradas a partir deles para o presente.

Montesquieu distingue três tipos de governo, tripartição que remonta à filosofia política da Antiguidade. Aristóteles (384-322) nomeia-as: a monarquia, em que o poder se concentra em uma pessoa; a aristocracia, em que o poder se concentra num grupo de pessoas; a democracia, em que o povo exerce o poder através de representantes eleitos. Cada uma dessas formas pode se degenerar: a monarquia, em tirania, a aristocracia, em timocracia e a democracia, em demagogia.

Em Montesquieu, essas três formas aparecem um pouco modificadas, orientadas que foram pelas condições políticas de seu tempo. O ponto de referência já não é a antiga pólis, e sim o mundo de Estados do século XVIII.

O “esprit general” é o conceito criado por Montesquieu para a cultura política, madura e inconfundível, de um país. É muito mais abrangente do que a “volonté générale”, a “vontade geral” de Rousseau, que representa somente a soberania e a unidade política de um país.

A divisão proposta por Montesquieu entre governo (Executivo), Parlamento (Legislativo) e tribunais (Judiciário), ultrapassou tanto a separação de poderes entre rei e parlamento, sugerida por John Locke, quanto a realidade constitucional praticada na Inglaterra. Tratava-se de uma teoria revolucionária, que apontava para o futuro.

Montesquieu tornou-se um dos grandes mentores políticos do estado de direito moderno, em que o projeto de separação de poderes sempre teve um significado mais amplo: a teoria do “check and balance”, do equilíbrio e controle recíproco de interesses e instituições, se tornou a base de negócios das democracias ocidentais.

Fonte de Consulta

ZIMMER, Robert. O Portal da filosofia: Uma Breve Leitura de Obras Fundamentais da Filosofia Volume 2. Tradução Rita de Cassia Machado e Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes, 2014.