01 janeiro 2019

Mosca Socrática

"Uma existência sem análise é adequada para o gado, mas não para os seres humanos." (Sócrates)

Sócrates, há cerca de 2.400 anos, em Atenas, foi pintado por Platão como uma "mosca". A mosca é vista como um inseto incômodo, nojento e perturbador. Observe quando uma delas fica rodeando os alimentos de nossa refeição diária. Mas, por que motivo Sócrates era considerado uma mosca? Por causa de suas perguntas embaraçosas.

As perguntas socráticas têm um duplo caráter: ironia e maiêutica. Na ironia, confunde o conhecimento sensível e dogmático. Na maiêutica, dá à luz um novo conhecimento, um aprofundamento, sem, contudo, chegar ao conhecimento absoluto. Há diversos exemplos dos diálogos socráticos em que confunde vários interlocutores. Na conversa dele com Eutidemo, Sócrates perguntou-lhe se ser enganador correspondia a ser imoral. A resposta foi afirmativa. Com um contra-exemplo, Sócrates mostrou-lhe que o comentário geral de que ser enganador é imoral não se aplica a todas as situações.

Quanto à coragem. Sócrates, querendo apreender o conceito de coragem, dirigia-se ao um general, e perguntava-lhe: — você que é general, poderia me dizer o que é a coragem? O general respondia-lhe: — coragem é atacar o inimigo, nunca recuar. Porém, Sócrates contradizia: — às vezes temos que recuar para melhor contra atacar. E a partir daí continuava o debate ampliando o conceito.

Observe a sua postura quanto ao enigma do Oráculo de Delfos relatado por Querefonte. "Existe alguém mais sábio que Sócrates?", perguntou Querefonte. "Não", foi a resposta. "Ninguém é mais sábio que Sócrates." Primeiramente, não acreditou no que Querefonte lhe disse; depois, refletiu e deu razão ao Oráculo. Segundo o seu modo de ver, várias pessoas eram capazes em sua área de atuação, mas ninguém era mais sábio que ele porque a maioria não sabia do que estava falando. Para Sócrates, a sabedoria é procurar entender a natureza da nossa existência e até onde podemos ir com o próprio saber.

A sua dedicação à arte de perguntar diz respeito ao seu modo de ser, ou seja, conversar e não escrever. Ele dizia que as palavras escritas não podem replicar; não podem nos explicar nada quando não as entendemos. No diálogo, podemos contradizer mais de uma vez e chegarmos a um acordo de ideias.

Todo o filósofo deveria se esforçar por ser uma mosca, ou seja, propor, por meio de perguntas embaraçosas, uma nova maneira de ver a mesma coisa.

Fonte de Consulta

WARBURTON, Nigel. Uma Breve História da Filosofia. Tradução de Rogério Bettoni. Porto Alegre, RS: L&PM, 2012. (Coleção L&PM POCKET)